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A penhora online nas execuções fiscais

A (im)possibilidade da constrição antes da citação

Ab initio, a título didático, convém destacar, relembrar e esclarecer os dois institutos jurídicos aqui tratados, a saber: i) a penhora online; e, ii) a citação.

A penhora online é uma medida jurídica constritiva que busca, por meio de sistema eletrônico próprio, denominado BACENJUD, bloquear e transferir valores da conta bancária do devedor em uma ação judicial para uma conta judicial que fica à disposição do Juiz, sendo que somente este poderá decidir o destino da eventual quantia bloqueada.

Já a citação, é o ato formal pelo qual o devedor ou réu toma ciência de que contra ele tramita um processo.
Pois bem. Recentemente, sobre a referida ferramenta eletrônica, surgiu um entrave processual a despeito da possibilidade da penhora online ser realizada antes mesmo da citação, sob fundamento jurídico com base no artigo 854, do Código de Processo Civil.

Muito embora o Novo Código de Processo Civil tenha trazido inovações práticas pautadas na efetividade dos instrumentos processuais, o certo é que, em que pese a normativa seja aplicada às Execuções Fiscais de forma subsidiária, pela simples leitura do dispositivo legal não há qualquer autorização expressa nesse sentido, vejamos:

“Art. 854. Para possibilitar a penhora de dinheiro em depósito ou em aplicação financeira, o juiz, a requerimento do exequente, sem dar ciência prévia do ato ao executado, determinará às instituições financeiras, por meio de sistema eletrônico gerido pela autoridade supervisora do sistema financeiro nacional, que torne indisponíveis ativos financeiros existentes em nome do executado, limitando-se a indisponibilidade ao valor indicado na execução.” – Grifo nosso.

A ginástica metal utilizada para validar a tese da PGFN se baseia na expressão “sem dar ciência”, a qual não atribuiu que a penhora online possa ser realizada antes mesmo da citação do devedor, pois esta é uma regra clássica processual que todo discente aprende durante os primeiros anos de ensino no Curso de Direito.

Inobstante a clara intenção ilegal do Ente Público, a referida tese tem sido rechaçada pelos Tribunais Pátrios, à exceção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, que detém competência de atuação e jurisdição sobre as Seções Judiciárias dos Estados de São Paulo e de Mato Grosso do Sul.

Especialistas atribuem que a referida prática constritiva entra em conflito direto com a Lei de Execuções Fiscais, no artigo 8º, bem como no artigo 185-A, do CTN, ocasião em que o devedor deverá ser “citado para, no prazo de 5 (cinco) dias, pagar a dívida com os juros e multa de mora e encargos indicados na Certidão de Dívida Ativa, ou garantir a execução”.

Conquanto, ainda, que no artigo 185-A, do CTN, as medidas constritivas, leia-se penhora online, apenas se iniciarão após escoado o prazo para pagamento ou garantia (quando não a tenha) do débito pretendido pela Fazenda Pública.
Note que não há necessidade de muito devaneio para se chegar à conclusão de que tal medida constritiva, antes da citação, é manifestamente ilegal, até mesmo entra em contradição com o ordenamento legal vigente (LEF e CTN) que norteia as formas de cobrança da dívida ativa da Fazenda Pública.

A Lei de Execuções Fiscais (LEF) deixa claro que o devedor será citado para pagar a dívida em cinco dias ou, ainda, que garanta a Execução, por meio de bens que não são necessariamente dinheiro, situação esta última comumente utilizada para discutir o próprio débito (inexigibilidade ou excesso) por meio da defesa cabível (Embargos), sendo que para adoção deste último procedimento, exige-se que a dívida esteja integralmente garantida.

Portanto, a lei é enfática ao conferir tais possibilidades ao devedor e, com a devida vênia à tese esposada pela PGFN, que busca qualificar todos devedores como fraudadores em potencial, o certo é que para isso há instrumentos legais hábeis, v.g., ação cautelar fiscal, não sendo permitido burlar o sistema normativo vigente para chegar a este absurdo interpretativo, sob pena de colocar em xeque a segurança jurídica, comprometendo o modelo constitucional de tripartição dos poderes.

Por derradeiro, embora o Superior Tribunal de Justiça (órgão que também julga recursos advindos dos Tribunais Federais) tenha proferido decisões contrárias ao interesse do Fisco, inclusive por meio do julgamento do REsp nº 1.645.999/PE, a PGFN tem utilizado desta ferramenta a seu favor o que, até que se pacifique este entendimento, muitos contribuintes devedores poderão sofrer consequências negativas, razão pela qual se justifica, ainda mais, a intensificação do controle de suas dívidas fiscais.

Júlio Cardoso Higashi, advogado do Escritório Crivelari & Padoveze Advogados, responsável pelo Departamento Jurídico Tributário do Simespi.

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