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CUIDADOS ESPECIAIS COM A RECUPERAÇÃO DE CRÉDITOS TRIBUTÁRIOS

“A recuperação tributária deve ser amplamente debatida, estudada e definida com a participação da alta direção da empresa“.

 

Cada vez mais as empresas buscam oportunidades para obter ganhos financeiros com a recuperações de créditos tributários pagos indevidamente ou a maior.

 

Inúmeras empresas de assessoria jurídica tributária ou mesmo consultorias especializadas oferecem esse tipo de serviço. Não há que se olvidar que, quando o assunto é recuperação de créditos tributários, o empresário cresce os olhos. Afinal, com uma carga tributária escorchante com a qual vivemos em nosso país, nada mais interessante do que apostar em estratégias potenciais de se obter vantagens tributárias mediante ações administrativas ou judiciais, colocando dinheiro no bolso através da compensação ou ressarcimento de tributos. Muitas vezes essa é uma grande alternativa de salvaguardar o caixa da empresa para que esta cumpra com seus compromissos financeiros ou invista seu capital no giro do negócio.
Neste contexto, surgem alguns percalços que merecem redobrada atenção no momento de se optar pela recuperação de créditos tributários. Vamos a eles:

 

Entenda diferença de uma recuperação tributária administrativa e judicial: Muitas vezes o empresário sequer compreende qual o formato da recuperação tributária. As duas vias possuem seus prós e contras. Normalmente a via administrativa é mais célere, contudo, se não feita de forma criteriosa e legal pode se tornar uma verdadeira “bomba”. Pela via administrativa há que se sopesar as questões atinentes a retificação de todas as obrigações acessórias pertinentes ou o reconhecimento extemporâneo diretamente na apuração. Neste último caso, cabe avaliar o contexto de cada tributo e se há permissão legal para referido procedimento. No que toca a recuperação judicial, a via mais comumente utilizada é o mandado de segurança, o qual libera o impetrante do ônus da sucumbência em caso do não reconhecimento de seu pleito.

 

Saiba que cada tributo tem sua competência e legislação específica: Sempre quando se fala em restituição ou compensação se torna imperioso analisar qual legislação pertinente aquele tributo. Isto é, cada tributo tem sua particularidade, sua competência tributária e seu ente arrecadador (sujeito ativo). Quando se fala em tributo municipal, por exemplo, imprescindível analisar a legislação daquela municipalidade para que se possa pleitear uma restituição e/ou compensação. Nos casos de tributos de competência Federal, fundamental analisar a Instrução Normativa 1.717/217 a qual estabelece normas sobre restituição, compensação, ressarcimento e reembolso, no âmbito da Secretaria da Receita Federal do Brasil. Frise-se, todo cuidado é pouco quando se analisa a legislação específica em matéria tributária.

 

Evite aventuras jurídicas: Existem diversas teses tributárias e justamente por essa razão o empresário deve se certificar qual o status da discussão perante os Tribunais. Não obstante, cabe uma análise mais criteriosa ainda quanto a recuperação de créditos de forma administrativa. Procure entender como a Receita Federal encara o assunto. Verifique se há soluções de consulta sobre o tema e observe como o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF vem se posicionando a respeito. Procure dar preferência a recuperações tributárias seguras cuja inconstitucionalidade já fora reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal – STF e que a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional já tenha emitido Nota Técnica sobre o tema. Como exemplo recente, a cobrança da contribuição previdenciária patronal sobre o salário maternidade (Nota Técnica 20/2020). Muito cuidado com os famigerados “créditos podres”. Outros tipos de crédito que geram bastante incerteza quanto a sua procedência são aqueles créditos financeiros federais e os decorrentes de precatórios, que normalmente são objeto de cessão com deságio. Tais modalidades podem representar um enorme problema a empresa cessionária e adquirente desse tipo de crédito. Redobre a atenção para estes casos!

 

Além do Advogado, não deixe de consultar seu Contador: Esse “mix” de opiniões entre advogado e contador é muito enriquecedor. Muitas vezes o advogado tem uma postura mais arrojada e vislumbra a execução dos trabalhos de maneira mais rápida possível objetivando auferir benefícios imediatos ao seu cliente. O contador, por sua vez, pode contribuir com sua postura conservadora fazendo com que a reflexão na tomada de decisão seja mais prudente. Significa dizer que o empresário deve ouvir os dois lados e entender os reflexos que aquela recuperação tributária causará analisando o caso com uma abordagem mais ampla e sistêmica. Outrossim, advogado e contador devem procurar o melhor para seu cliente. A primeira pergunta que deve ser feita ao empresário é: Será que de fato sua empresa necessita usufruir imediatamente daquele benefício? Ou será que podemos esperar uma posição mais sedimentada dos Tribunais para usufruir dos créditos objeto de recuperação? Vamos ao exemplo: Diversas empresas ingressaram com o mandamus pleiteando a exclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS. Após anos de discussão, em março de 2017, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, por maioria dos votos (6 votos a favor, contra 4), decidiu, no Recurso Extraordinário (RE) 574.706, com reconhecida repercussão geral, pela inconstitucionalidade da inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da Cofins. Inconformada com a decisão, a União opôs embargos de declaração visando a modulação dos efeitos da decisão, bem como questionando qual o ICMS deveria ser excluído da base de cálculo do PIS e da COFINS, ou seja, o destacado nas notas fiscais ou o apurado no mês. Contudo, algumas empresas que já possuem sentença transitada em julgado, optaram por ingressar com Pedido de Habilitação e iniciaram as compensações utilizando o critério do ICMS destacado nas notas fiscais. Não obstante, passaram também a excluir o ICMS destacado da base de cálculo das contribuições. A “dor de cabeça” que tais empresas deverão enfrentar agora é que a Receita Federal do Brasil não só emitirá Despachos Decisórios não homologando as compensações pleiteadas, como também inscreverá na dívida ativa as diferenças de PIS COFINS com exclusão do ICMS destacado. Pergunta-se: Será que uma empresa com boa saúde financeira e perfil conservador necessitaria tomar essa decisão e carregar consigo todo esse contencioso administrativo para gerenciar? Desta feita, toda decisão no entorno do ressarcimento, restituição e compensação de tributos deve derivar de criteriosa análise jurídica e sobretudo contábil.

 

Prescrição e Decadência: Ouça os especialistas acerca desses temas. Solicite a eles que elaborem uma linha do tempo com todos os aspectos temporais daquela operação traçando cada momento processual. Não entre em enrascadas de pedir créditos prescritos ou que já foram fulminados pela decadência. No mais, cuidado com as retificações de obrigações acessórias em períodos objeto de pedidos de restituição ou compensação de créditos. Tais práticas podem reabrir os prazos de contagem da prescrição concedendo um período mais alongado para a fiscalização.

 

Guarda de Documentos: Todo pedido de recuperação tributária pode ser revisto pelo ente tributante dentro do prazo de 05 (cinco) anos. Logo a guarda de documentos físicos e digitais são elementares. Cuidado com as reaberturas de prazo e mantenha toda documentação física em local fresco e arejado, bem como os arquivos digitais em backups com replique em nuvem. Saiba que no momento de comprovar a materialidade do crédito toda a documentação e arquivos pertinentes devem ser prontamente apresentados com vistas a subsidiar as defesas e manifestações de inconformidade eventualmente apresentadas. Se sua contabilidade não é interna faça a lição de casa e entenda desse assunto junto ao seu departamento de Tecnologia da Informação. Se sua contabilidade é terceirizada, certifique-se de que seu parceiro possui os devidos backups e toda comprovação nos demonstrativos financeiros e contábeis. Não são raros os casos em que contribuintes ao ingressarem com o Pedido de Habilitação de crédito, sequer possuem a documentação comprobatória ou mesmo não o fazem quando necessitam comprovar ou solicitar uma diligência na documentação no curso do contencioso administrativo ou judicial para que a fiscalização possa aferir a legitimidade do crédito pleiteado.

 

Saiba o histórico do profissional que você vai contratar: Muitos picaretas existem nesse mercado, então cuidado redobrado! Evite abordagens repentinas e em massa onde o profissional fica insistindo para que a empresa assine o contrato. Duvide das ofertas no estilo black friday onde os preços e condições são minimamente estranhas. De preferência a empresas locais ou indicações de pessoas de confiança, mas sempre busque o lastro daquele escritório ou daquele profissional. Normalmente os picaretas atacam outras praças e se dizem trabalhar para grandes corporações ou se dizem conhecidos de agentes públicos que podem facilitar a liberação de créditos com o aperto de apenas um botão. Não entre em enrascadas, pois tem muita gente por aí vendendo “terreno na lua”. Não há milagre.

 

Contabilização e Notas Explicativas: Será que seu Balanço Patrimonial demonstra aos usuários da informação contábil um potencial recuperação tributária devidamente lançada como contingência ativa e representado em Notas Explicativas, nos termos do CPC 25? Cabe ao profissional contábil receber essa informação da empresa para realizar o lançamento reconhecendo no balanço, quando provável seu resultado. Logo, certifique-se que os registros contábeis quanto aquela potencial recuperação tributária estão devidamente reconhecidas no balanço patrimonial.

 

Tributação das receitas sobre a recuperação de créditos: Essa questão muitas vezes passa desapercebido pelos profissionais da área tributária, advogados, contadores e até auditores. Todo registro contábil de um crédito tributário, gera um acréscimo patrimonial para a pessoa jurídica, e de acordo com a legislação, para as empresas do regime do Lucro Real, esse aumento incide tributação do IRPJ e da CSLL. Voltemos ao caso do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS, onde muitas companhias obtiveram trânsito em julgado de suas sentenças. A polêmica gira em torno do momento da contabilização e da tributação do IRPJ e da CSLL, em relação ao total dos créditos reconhecidos judicialmente e que serão objeto de compensação administrativa. Neste sentido, a RFB já se manifestou que a tributação do IRPJ e da CSLL sobre os créditos do PIS e da COFINS (exclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS), ocorre no momento do trânsito em julgado da ação judicial. Com esse entendimento, haveria a tributação antes mesmo de a empresa auferir o benefício, ou seja, antes do momento da compensação ou do ressarcimento dos referidos créditos tributários. Devido as incertezas sobre o tema, algumas empresas ingressaram judicialmente para evitar o reconhecimento da receita, ou seja, a contabilização antes das compensações e obtiveram pareceres favoráveis. No entanto, devido a insegurança sobre o assunto recomenda-se neste e noutros casos de recuperação tributária um próximo acompanhamento contábil e tributário para a identificação do reconhecimento do crédito, no momento apropriado, a fim de evitar questionamento por parte da Receita Federal do Brasil.

 

Enfim caros leitores, recuperação tributária é um assunto sério que deve ser amplamente debatido, estudado por todos os envolvidos, em especial contador e advogado, mas sempre definido pela alta direção da companhia. Permanecer alheio a todos esses cuidados é o mesmo que navegar em águas revoltas sem qualquer direção e na iminência de se chocar com um iceberg.

 

Dr. Luiz Angelo Sabbadin é Contador e Advogado, Diretor Executivo Comercial da Semcon Contabilidade, atua nas áreas da Consultoria Tributária, Empresarial e do Contencioso Administrativo Tributário; Especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (IBET); Pós-Graduado em Administração de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas (FGV); Pós Graduado em Controladoria e Finanças pela UNICAMP; Conselheiro Membro do Conselho Municipal de Contribuintes de Piracicaba/SP e Diretor Financeiro do SINCOP – Sindicato dos Contabilistas de Piracicaba e Região E-mail: luiz@semcon.com.br

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